30.3.07

humanidade transbordante

por que há muito de mim por aí, e eu preciso ter de volta. tem feito falta essas partes sumidas. bem que poderiam se restabelecer em meu peito essas imagens deslocadas que tento dar forma. ainda poderiam, quem sabe, dar algum sentido ao que parece ilógico. mesquinho como nunca fui, estou pedindo de volta não só meus livros, gibis, cds e outras quinquilharias, quero de volta também essa coisa que nem sei ao certo o que é mas que tem feito muita falta. algum espelho que me restabeleça a humanidade, esse vínculo tão frágil que temos com tudo que nos é estranho. algum trocado que sirva para metafísicas. vou trocar de óculos, estes já não me mostram o que quero ver, o que preciso. quero restabelecer a humanidade, a minha transbordou, não se conteve, e agora já falta.

29.3.07

o abismo e eu.

era verídico o desconforto, não sei de onde eu via as coisas, mas a visão, esta sempre me assustou muito. sempre lidei bem com os problemas, martha sempre soube disso, mas o problema, o que não se mostra, este sempre temi. sempre o procurei, é verdade, mesmo me esgueirando pelos cantos sempre o busquei, mas não sem um estoque de motivos e um bocado de provocação.
descortinei minha vida dos cuidados, a maldição dos que não crêem em nada sempre me perseguiu e o pagamento para manter-se a salvo é alto: a solidão, a moeda corrente da minha vida. tudo que comecei sempre me levou ao mesmo lugar, sempre acabou comigo. mas precisava, tinha que vencer a vertigem e buscar conforto no abismo. tinha que conseguir um meio de continuar vivendo com este desconforto que não explico.

28.3.07

correnteza arrastando tudo em volta...

a busca envolvia o tato, e tateando mapeei o caminho a se seguir, e ele era torto. determinei limites e fronteiras e elas eram falhas. desenhei possíveis rotas de fuga e elas eram inúteis. o mapa, no corpo descoberto e desenhado, só mostrava o que não servia. fui tolo, muito tolo, pois só tarde percebi que isto era tudo que importava: cuidar do que dispensa cuidado.
estava, deveras, cansado de estar armado até os dentes e à frente de um exército de mim mesmo. aquela corda bamba onde me equilibrava parecia querer brincar comigo, não para derrubar-me, mas para o deleite de ver-me em constante exercício. alerta, sempre alerta. embranquecendo meus cabelos em câmera lenta e a olhos vistos. tinha a sensação nítida, enquanto tentava mudar o mundo, de que estava apenas deixando-me ser levado, e a correnteza arrastando tudo em volta. cuidadosamente destrutiva.

26.3.07

sentei com a solidão num buteco qualquer.

sentei com a solidão num boteco qualquer, contei-lhe anedotas e ela parece ter gostado da companhia. outros 10 anos passariam sem que notasse se você não aparecesse, parecia música atonal, e sua cruel presença, você pode ser tão cruel, fosse fiscalizando os sacos de lixo memoriais que guardavam cada ano que passou. reativou-se uma bomba relógio adormecida até então e o conforto de se estar perdido expirou. a tua ausência, o combustível da minha fuga, agora requisita o descanso de bandeiras ao sol. e redemoinhos violentos espreitam meu caminho de volta pra casa.

19.3.07

março esta querendo ir embora... e eu também.

liga não. é março mostrando as garras. é sempre assim, chega de mansinho, despretensiosamente, e no final, tu queres ir embora junto. sou bem entendido de março. raras vezes me deixou impune. é sempre março em sonhos distantes, sempre esse mês cruel e indócil, sempre as mesmas tempestades (podes esperar), os mesmos ventos fortes arrancando raizes sagradas. quisera eu ser uma folha seca (como os chutes de didi), mas sou raiz fincanda forte lá no chão. sem perdão, sou o jardineiro de mim mesmo.

17.3.07

Aceno devagar pois as despedidas doem.

16.3.07

eu sou meu próprio vírus de estimação, não preciso de hospedeiro pra viver.

não tinha balança que equilibrasse os pesos, pendiam pelas bordas e escapavam a qualquer sistematização. a maré violenta de acontecimentos agora era a norma e ali me sentia muito bem. prestes a estourar, uma dor bem particular, minha cabeça vivia a me pregar peças. tempestades irrompiam violentamente em meus planaltos, calmarias transtornavam minhas planícies, era um acidente geográfico acontecendo. não pouparia nada pelo caminho, avalanche incendiária, represa rompida, promessa de destruição. um perigo iminente minha presença, um risco que se aceita por ser irremediável. impus minha condição ao que parecia incondicional, me tornei meu acidente de estimação.

15.3.07

domínio do fogo

aquela peregrinação prometia um paraíso provisório, a própria busca era o achado; pelo caminho, torpes e nobres motivos iam sendo empilhados lado a lado no lixo da percepção. cacei motivos e caçoei dos traiçoeiros, acreditava apenas em mim mesmo. tive tantos antes, me embriaguei tanto, que agora queria a carestia, o domínio do fogo. fui buscar a calma na tormenta, em que outro lugar conseguiria ajustar esta fadiga? nenhum encontro foi marcado, todas as horas esforçavam-se em passar muito lentamente e pensei que desafiando o tempo, conseguiria desposá-lo. o erro não estava em mim ou no tempo, talvez na explosão inicial que pôs tudo a girar incessantemente. mas o atestado de culpa carregava tatuado no corpo.

14.3.07

o epicentro do terremoto

Encobrindo paisagens e distorcendo horizontes, fui permitindo-me ser guiado por uma tropa de mescaleiros clandestinos. E quanto mais adeus me eram dados menos eu sabia quem estava partindo, e minha bagagem ia ficando cada vez menor e menos tolerante. Não tinha alternativa, acompanhei a primeira oportunidade e me refugiei numa distante cidade de sonhos atrasados. Eu mesmo ia me atrasando em me realizar e de todos os lados candidatos à verdade pareciam querer me conquistar. Deixei um rastro de fumaça de novos vícios, perigos iminentes tentando frear meus passos. Sou intransigente como notícias velhas e me considero meu único dono. Fácil me encontrar: ir na direção onde todos estão fugindo, o epicentro do terremoto.

12.3.07

efetivamente, sobre o quê e sobre quem posso dizer: "eu conheço isto!"? este coração que há em mim, posso senti-lo e julgo que ele existe. o mundo, posso tocá-lo e também julgo que ele exite. aí se detém toda a minha ciência, o resto é construção. pois quando tento captar este eu no qual me asseguro, quando tento defini-lo e resumi-lo, ele é apenas água que escorre entre meus dedos. posso desenhar, um por um, todos os rostos que ele costuma assumir, todos também que lhe foram dados, esta educação, esta origem, este ardor ou estes silêncios, esta grandeza ou esta baixeza. mas não se somam os rostos: este coração que é o meu permanecerá indefinível para sempre. o fosso entre a certeza que tenho da minha existência e o conteúdo que tento dar a esta segurança jamais será superado. para sempre serei estranho a mim mesmo.


do filósofo franco-argelino albert camus, em "o mito de sísifo".

2.3.07

dor que ninguém sentiu é o sentimento mais comum

às vezes é por medo
me tranco no cofre
e esqueço o segredo

às vezes é por raiva
que paro e não
digo uma palavra

às vezes, como agora,
eu fico em casa
e jogo a chave fora

às vezes vou pra longe
e já tarde volto
às vezes sorrio
noutras me revolto

mas não quero ser o
mesmo que às vezes sou
estou cansado de ser
tudo aquilo que eu sou
eu quero sair e não
sei pra onde vou
em todo lugar sou
diferente do que sou

nem sempre eu sou o mesmo
nem sempre eu sou aquilo
que se pensou
nem sempre sou o mesmo
nem sempre sei quem sou

1.3.07

brokenheart and some cigarretes

hoje eu quero te ver de perto
quero te mandar pro inferno
quero te comunicar aos berros
que eu vou te esquecer

and i still believe that i can not be saved

falando aos seus pés que estava tudo bem
tudo em volta, em todo lugar
agora sim você vai ver
as cores vermelhas que tanto escondi
todos sabem que não me conhecem

tive que sentir medo das coisas que
saiam dos meus lábios
eu ia para fora, para a cidade
cansei de cortar os pulsos
agora quero viver
tudo em volta, em todo lugar
as cores vermelhas que escondi
não posso mais controlar
brilham sem minha permissão

pela dor, salve você, mãe do mundo
na minha raiva, salve você, mãe de
nenhum mundo, pela dor, salve-se
eu não tenho salvação

as cores que criei me sublevaram
todos sabem que não me conhecem
e agora eu mesmo desisti.